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AbrePaz

Nota pública nr. 002/2020 Abrepaz - Estupro, pedofilia e interrupção de gestação.

Estupro, pedofilia e interrupção de gestação


359. No caso em que o nascimento da criança puser em perigo a vida da mãe, haverá crime em sacrificar-se a primeira para salvar a segunda?


“Preferível é se sacrifique o ser que ainda não existe a sacrificar-se o que já existe.”

(O Livro dos Espíritos, de Allan Kardec)



A Abrepaz repudia a violência sexual, o estupro, a cultura machista, a pedofilia, o assédio e toda forma de violência, incluindo a cumplicidade e o silenciamento por parte de familiares e autoridades.


A sociedade brasileira, formada em um caldo de cultura patriarcal, misógina e machista, sempre naturalizou a violência contra as mulheres e contra as crianças. Abusos e violências infelizmente sempre existiram em terras brasileiras e por séculos não havia uma rede de proteção que garantisse às vítimas o direito à proteção e reparação. Autoridades governamentais, agentes públicos e autoridades eclesiásticas, além de familiares, tinham por hábito desacreditar às vítimas (quando estas tinham coragem de denunciar seus algozes) e proteger os autores dos atos criminosos.


Criminosos sim! E é o que vemos repetir infelizmente até os dias atuais. Com enorme tristeza acompanhamos o ocorrido com a criança de 10 anos que foi estuprada pelo seu tio dos 6 aos 10 anos! São crimes de estupro de vulnerável, pedofilia!!! Lamentavelmente, crimes semelhantes ocorrem diariamente. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública divulgado em setembro de 2019, o número de estupros em 2018 foi recorde, 66 mil vítimas, sendo 53,8% meninas de até 13 anos, ou seja, 4 meninas até esta idade são estupradas por hora no Brasil! São 180 crimes de estupro por dia! O agressor é muitas vezes um familiar! (1)


É claro que quando crimes assim acontecem, significam que toda a sociedade está doente. Mas é urgente não permitir que moralistas e fundamentalistas invertam a ordem. Diante do fato, a criança é a vítima e deve ser amparada em todas as suas necessidades, e ter sua dignidade restaurada e protegida. O tio deve ser responsabilizado pelo crime que cometeu reiteradas vezes!


E amparar as necessidades desta criança incluem, entre outras ações, proteção física, psicológica e emocional; guardar sigilo e jamais ser exposta; ter direito a um ambiente familiar que lhe garanta amparo e um desenvolvimento humano restaurativo; e a interrupção da gravidez fruto de violência (estupro) e que coloca sua própria vida em risco!


Trata-se de uma criança a quem a família, a sociedade e o Estado deveriam proteger.


Neste sentido, a Abrepaz repudia qualquer discurso ou ação fundamentalista de religiosos, inclusive espíritas, que no desejo de defender a vida, condenam a interrupção da gestação, criminalizando a criança e toda a equipe médica!


Toda relação sexual entre um adulto e uma criança ou adolescente menor de 14 anos é considerada estupro de vulnerável. A equipe médica agiu com autorização judicial e em conformidade com a lei (artigo 128 do Código Penal Brasileiro) que prevê o aborto em tais condições: gravidez decorrente de estupro e risco à vida da gestante. Há sempre risco para gestante com menos de 14 anos. Risco para a mãe e para o bebê.


É necessário defender a vida desta criança que, com 10 anos de vida, já acumula traumas que talvez jamais sejam superados nesta existência. A vida não pode ser instrumentalizada. A gravidez foi fruto de uma violência hedionda, isso bastaria para se acolher qualquer decisão de uma mulher em tais condições. Mas o caso é mais grave, é uma criança que não tem a menor condição biológica ou emocional (além de financeira) para levar a termo esta gestação.


Falta humanidade aos seres humanos! Falta empatia! Sobram julgamentos moralistas!


Os religiosos, incluindo os espíritas, têm o dever de compreender e acolher! Simples assim. Toda ação no sentido de criminalizar a criança e a equipe médica, de causar constrangimento, culpa, dor, embaraço, vergonha, é fruto do mais puro puritanismo, hipocrisia, ódio e fundamentalismo que, na história do mundo, já causou dores, violências, guerras e mortes em nome de Cristo ou de Deus.


Deus é amor, acolhimento, abraço, empatia, compreensão, restauração, sorriso, misericórdia, apoio, e tudo mais que promova a humanidade dentro de cada um. Qualquer outra coisa em nome de Deus vem dos pensamentos humanos tentando falar em nome dEle, com uma autoridade que nunca lhes foi conferida, e tentando controlar e subjugar as consciências alheias, a partir da própria consciência muitas vezes punitivista, sofredora, maniqueísta e necessitada de tratamentos psicológicos e restaurativos.


A Abrepaz defende os Direitos Humanos e acredita no diálogo da Doutrina Espírita com tais leis e princípios dignificadores dos seres humanos.


Defendemos o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que protege a criança como sujeito de direitos e que devem ser garantidos pela família, sociedade e pelo Estado.


Defendemos a educação sexual de crianças e adolescentes com o propósito que elas saibam que há partes de seus corpos que não podem ser tocadas, para entenderem sobre o que são abusos e assédios, para saberem como podem proceder ou denunciar caso necessitem, inclusive parentes ou os pais, uma vez que a maioria dos casos de violência sexual contra crianças e adolescentes acontecem em ambiente doméstico.


Defendemos a responsabilização e a justiça contra todos e todas que cometam crimes, incluindo os crimes que nascem da cultura do machismo (algo tão pouco falado pelos espíritas e religiosos em geral).


Defendemos o direito a vida de todas e todos, não somente do espírito reencarnante, mas também do espírito já encarnado a quem, muitas vezes, a sociedade hipócrita lhe retira o direito às oportunidades de moradia, educação, proteção, alimentação, trabalho, a constituir família, a ser quem é e se desenvolver plenamente em suas potencialidades.


Transcrevemos ainda alguns textos extraídos de O Livro dos Espíritos para análise, sem dogmatismos e fundamentalismos, visando compreender que a vontade expressa nas leis divinas é a do acolhimento, compreensão e amor, e não a da prepotência, arrogância, julgamento e punição.



336. Poderia dar-se não haver Espírito que aceitasse encarnar numa criança que houvesse de nascer?


“Deus a isso proveria. Quando uma criança tem que nascer para viver, está predestinada sempre a ter uma alma. Nada se cria sem que à criação presida um desígnio.”



346. Que faz o Espírito se o corpo que ele escolheu morre antes de se verificar o nascimento?


“Escolhe outro.”



347. Que utilidade encontrará um Espírito na sua encarnação em um corpo que morre poucos dias depois de nascido?


“O ser não tem então consciência plena da sua existência; a importância da morte é quase nenhuma. Frequentemente é, como já dissemos, uma prova para os pais.”



353. Não sendo completa a união do Espírito ao corpo, não estando definitivamente consumada, senão depois do nascimento, poder-se-á considerar o feto como dotado de alma?


“O Espírito que o vai animar existe, de certo modo, fora dele. O feto não tem pois, propriamente falando, uma alma, visto que a encarnação está apenas em via de operar-se. Acha-se, entretanto, ligado à alma que virá a possuir.”



354. Como se explica a vida intrauterina?


“É a da planta que vegeta. A criança vive vida animal. O homem tem a vida vegetal e a vida animal que, pelo seu nascimento, se completam com a vida espiritual.”



356. Entre os natimortos alguns haverá que não tenham sido destinados à encarnação de Espíritos?


“Alguns há, efetivamente, a cujos corpos nunca nenhum Espírito esteve destinado. Nada tinha que se efetuar para eles. Tais crianças então só vêm em função de seus pais.”



357. Que consequências tem para o Espírito o aborto?


“É uma existência nula, a ser recomeçada.”





Brasil, 18 de agosto de 2020

Associação Brasileira Espírita de Direitos Humanos e Cultura de Paz - Abrepaz

Diretoria Executiva



 

Notas:

1 ESTATÍSTICAS - Estupro bate recorde e maioria das vítimas são meninas de até 13 anos. Disponível em:



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